Um estudo desenvolvido na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) identificou que muitos cuidadores familiares estão adoecendo em um cenário de elevada ocorrência de condições crônicas não transmissíveis. A conclusão foi do enfermeiro Marcus Luciano de Oliveira Tavares, que avaliou um grupo populacional de cuidadores familiares e seus dependentes, vinculado a dois serviços de Atenção Primária à Saúde de Belo Horizonte, para sua tese de doutorado no Programa de Pós-graduação em Enfermagem da UFMG.
De acordo com o pesquisador, as mudanças nos perfis demográficos, nutricionais e epidemiológicos da população brasileira têm aumentado a ocorrência de doenças e agravos não transmissíveis que, quando não provocam a morte de seus portadores, geram sequelas e lesões incapacitantes, tornando-os dependentes de cuidados que, em geral, ficam sob responsabilidade de um membro da família.
O estudo constatou que o cuidado a uma pessoa dependente crônica é uma atividade duradoura, devido ao caráter comumente irreversível da condição. No período analisado pelo autor, houve piora ou estabilidade do nível de dependência. Nenhum indivíduo registrou melhora. “O papel de cuidador familiar é contínuo e sofre influência de diversos outros fatores. Esse caráter foi avaliado em nosso estudo em razão do tempo que o cuidador familiar exerce essa função. Tal fator se configura como risco para diminuição da sua qualidade de vida, especialmente nos domínios físico e de meio ambiente. Para justificar esse resultado em relação à dimensão física, podemos nos basear na deterioração do seu estado de saúde e na perda da capacidade intrínseca causadas pelo envelhecimento”, afirma Tavares.
Iniciativas de apoio
O estudo, que envolveu múltiplas abordagens (qualitativa, quantitativa e revisão de literatura), identificou oito fatores associados à qualidade de vida do cuidador. Metade deles está relacionado a garantias de proteção: praticar alguma religião, revezar o cuidado com outras pessoas, praticar atividade física e ter sono reparador. Os outros quatro são de risco: internação recente da pessoa dependente, ampliação do nível de dependência, idade e tempo na função de cuidador. “A maioria desses fatores são passíveis de intervenção, entretanto, esse estudo não identificou iniciativas governamentais de apoio a essas pessoas no Brasil. É necessário que seja criada uma frente intersetorial com formuladores de políticas, gestores, profissionais de saúde e famílias. Com o passar dos anos, a demanda por cuidadores familiares tende a aumentar. Por isso, é urgente a inclusão dessa temática nas agendas das nações”, defende o autor do trabalho.
“São doentes cuidando de outros doentes. Em alguns anos, estima-se que teremos muitas pessoas precisando de cuidados e poucas pessoas disponíveis para cuidar. Esse fenômeno tem relação com a inserção da mulher no mercado de trabalho e com a ocorrência de sequelas e lesões incapacitantes em pessoas mais jovens, entre diversos outros fatores”, explica Marcus.
O pesquisador enfatizou, ainda, que o cuidado à unidade familiar deve ser entendido como premissa pelos profissionais que atuam nos serviços de atenção primária à saúde, que é operacionalizada, na maior parte do território brasileiro, pelas equipes da Estratégia Saúde da Família. “Para cuidar da saúde da família, é preciso reconhecê-la como sistema vivo e dinâmico, cuja funcionalidade depende do papel que cada membro exerce. Afinal, a família é maior do que a soma de seus integrantes. Cuidadores familiares desempenham importante papel social e contribuem para a sustentabilidade do sistema público de saúde brasileiro”, avalia Marcus Tavares.