A compulsão alimentar é um transtorno cada vez mais frequente, principalmente entre mulheres. Marcada pela ingestão exagerada de alimentos em um curto período de tempo, geralmente acompanhada por culpa, ansiedade e perda de controle, a compulsão não tem a ver apenas com “falta de força de vontade”, mas com emoções não processadas, traumas antigos e hábitos alimentares desconectados das necessidades reais do corpo.
Segundo a Dra. Jaqueline da Mata, médica com foco na saúde mental da mulher e pós-graduada em psiquiatria, é fundamental tratar o problema como uma questão de saúde mental e emocional, e não apenas de comportamento alimentar. “Muitas mulheres comem para silenciar emoções que não sabem como lidar. A comida vira válvula de escape para sentimentos de inadequação, solidão, frustração ou estresse crônico”, explica.
Dados preocupantes no Brasil
A compulsão alimentar é caracterizada pela ingestão excessiva de alimentos mesmo sem fome real, frequentemente seguida por culpa, vergonha e desconforto físico.De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 4,7% da população brasileira sofre de compulsão alimentar, quase o dobro da média global, que é de 2,6%. Esses números colocam o Brasil entre os países com maior incidência do transtorno.
Além disso, condições como gastrite nervosa, altamente associadas ao estresse e à ansiedade, podem intensificar os episódios compulsivos. Essa condição, também conhecida como dispepsia funcional, afeta diretamente o sistema digestivo e pode causar sintomas como dor abdominal, sensação de estufamento e saciedade prolongada.
“A conexão entre o intestino e o sistema nervoso, chamada de eixo intestino-cérebro, é extremamente sensível ao estresse emocional. Quando há desequilíbrio emocional, o corpo responde com sintomas físicos e muitas vezes com comportamentos impulsivos, como a compulsão alimentar”, explica Dra. Jaqueline.
Dra. Jaqueline da Mata – médica com foco na saúde mental da mulher e pós-graduada em psiquiatria
Gatilhos emocionais: o que está por trás da fome?
Para a médica, é essencial que a mulher aprenda a identificar os gatilhos emocionais que despertam os episódios compulsivos. “Muitas vezes não é fome. É raiva, tristeza, rejeição, solidão. Mas como não fomos ensinadas a lidar com essas emoções, buscamos conforto na comida.”
O tratamento da compulsão, nesses casos, não se resume a dietas restritivas. Envolve o reconhecimento do padrão emocional, acompanhamento psicológico e, em alguns casos, o uso de medicamentos voltados para a regulação do humor e da ansiedade. Terapias alternativas como psicoterapia, acupuntura e práticas de autocuidado também têm mostrado bons resultados em determinados casos.
Quando a comida vira refúgio
Alguns sinais de alerta, segundo a médica, incluem:
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Comer grandes quantidades de comida mesmo sem fome;
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Sensação de perda de controle durante os episódios;
- Comer rápido demais e até se sentir fisicamente mal;
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Sentimentos de culpa, vergonha ou arrependimento depois de comer;
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Isolamento e negação do problema.
“Muitas mulheres se sentem envergonhadas, escondem os episódios e se culpam. Isso só aprofunda o ciclo de compulsão e sofrimento”, reforça.
Reconstruir a relação com o corpo e com a comida
Segundo a Dra. Jaqueline, é possível restaurar uma relação saudável com a comida a partir de três pilares: escuta emocional, alimentação consciente e apoio terapêutico. “Explorar a origem emocional dos comportamentos e dar novos significados à alimentação é um passo essencial para o reequilíbrio.”
Além do suporte clínico, a especialista também recomenda mudanças no estilo de vida, como uma rotina alimentar equilibrada, rica em fibras e nutrientes, prática regular de exercícios físicos e atenção à mastigação e à qualidade do sono, fatores que impactam diretamente no bem-estar físico e emocional.
Buscar ajuda é o primeiro passo
A médica reforça que a compulsão alimentar é um transtorno sério, mas com tratamento eficaz quando há acompanhamento adequado. “Não se trata de fraqueza ou falta de disciplina. É uma dor legítima que precisa ser tratada com acolhimento e cuidado técnico.”
Ela conclui: “Com o tratamento correto, é possível romper esse ciclo e reconstruir a autoestima. Comer bem é importante, mas comer com equilíbrio emocional é essencial.”